quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

O novo papel das bibliotecas



Arnaldo Niskier,Especial para Opinião Pública
“A internet é perigosa para o ignorante e útil para o sábio, porque não filtra o conhecimento e congestiona a memória do usuário. O excesso de informação provoca amnésia. Informação demais faz mal.” As afirmações são do escritor, filósofo e semiólogo italiano Umberto Eco, ponto de partida para a reflexão sobre A biblioteca do futuro, tema da instigante conferência do diretor do grupo Gol Mobile, Roberto Bahiense, proferida na Academia Brasileira de Letras durante o Ciclo As novas linguagens do século XXI, coordenado pelo Acadêmico Evanildo Bechara.
Sugerindo a desconstrução etimológica da palavra “biblioteca”em sua origem grega para, segundo ele, ampliar o alcance do seu significado, Bahiense afirmou que as bibliotecas físicas vão se transformar em espaços simbólicos: “É preciso considerar a palavra bíblion (livro) e desconsiderar téké, pois os significados caixa e/ou depósito reduzem e manietam o novo e ainda desconcertante papel das bibliotecas.”
De acordo com o conferencista, mais importante do que refletir sobre o sistema de disponibilização do conhecimento é pensar no usuário da informação adquirida. Considerando que o país vive a triste dicotomia – “escolas do século XIX, professores com recursos do século XX e alunos conectados com o século XXI” – percebe-se o despreparo de instituições democráticas para envolver e canalizar ações de interesses para a classe trabalhadora ampliada.
Segundo números presentes no Censo Escolar 2013, 65% das unidades de ensino do país, públicas e privadas, não têm bibliotecas. Desde 2010, quando entrou em vigor a lei 12.244 — que obriga todos os gestores a providenciar, até 2020, espaços estruturados de leitura em suas unidades educacionais —, a situação praticamente não evoluiu. Naquele ano, só 33,1% das escolas tinham bibliotecas; em 2013, eram 35%.
Embora em melhor situação, as escolas particulares ainda estão longe da universalização dos espaços de leitura: apenas 59% delas os têm, ante 28,9% das públicas.
Com a modernização e a facilidade de acesso à informação, Bahiense falou da urgente necessidade brasileira de democratização do conhecimento. O digital não inviabiliza ou inutiliza o impresso. Eles se complementam e permitem às poucas bibliotecas existentes no país oferecer mais opções de conteúdo ao usuário, com variação de suporte, formato etc. A tendência é de acervos híbridos, com os ajustes que cada tipo de documento exige. O digital favorece a preservação ao eliminar a manipulação e deslocamento de originais. O acesso é ampliado, com títulos disponíveis nos catálogos das bibliotecas, podendo ser consultados de qualquer lugar, em qualquer horário.
A realidade do nosso país impõe uma solução transformadora. Para Bahiense, essa solução passa pela criação de um novo canal de distribuição em ambiente livre.
(Arnaldo Niskier, da Academia Brasileira de Letras, presidente do Ciee/RJ e diplomado em Matemática e Pedagogia.)

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