sexta-feira, 3 de maio de 2013

E-books mais curtos ganham espaço no mercado editorial

E-books mais curtos ganham espaço no mercado editorial

Marginalizados no mundo analógico, onde amargam vendas baixas e a desconfiança das livrarias, formas mais breves de ficção e não ficção ganham uma nova chance entre os usuários de tablets e smartphones. Afinal, parece lógico que plataformas digitais cada vez menores e mais portáteis favoreçam obras menos extensas. Não por acaso, selos como Penguin Shorts e a Story Cuts (da gigante Random House) passaram a explorar o filão dos livros digitais curtos e baratos.

Chamados de e-shorts ou minie-books, eles oferecem conteúdo inédito ou recortes de obras já existentes no formato avulso, nos moldes dos singles de música do iTunes. No mesmo embalo, o Amazon Kindle Singles, serviço on-line que vende histórias entre 5 mil e 30 mil palavras por até US$3, já comercializou mais de 5 milhões de cópias desde sua criação, em 2011.

"Uma reclamação do usuário de tablet é a dificuldade em retomar a leitura de um livro longo, que precisa ser lido por partes", observa Sérgio Machado, presidente do Grupo Record, que ainda não lançou produtos nesse formato, mas vem acompanhando com interesse essa movimentação no mercado. "Dentro dessa lógica, acredito que o e-book se preste para o texto mais curto, que pode ser lido de uma sentada só".

A distribuição em formato avulso favorece quem busca uma leitura rápida e barata. No caso do Kindle Singles, que não tem previsão de lançamento no Brasil, a obra inédita é escrita especialmente para o serviço. Negociando de forma direta com a Amazon, sem intermédio das editoras, seus autores recebem 70% das vendas - o que representaria uma renda média de US$ 22 mil por single, segundo cálculos do jornal The New York Times. O formato está atraindo autores em busca de espaço (são mais de 1 mil manuscritos recebidos por mês), mas também nomes consagrados, como Stephen King e Chuck Palahniuk.

Contos

Apesar do potencial comercial, a comercialização do e-short ainda engatinha por aqui. Na última terça-feira, a editora Cosac Naify estreou no mercado digital disponibilizando uma série de contos avulsos de Tchekhov, Tolstoi e Robert Stevenson a R$ 5 cada. Em 2011, a Editora 34 comercializou, a R$ 0,99 e R$ 2,99, histórias avulsas do livro "Nova antologia do conto russo", que incluía autores como Ivan Turgueniev e Tolstói. As vendas surpreenderam, atingindo mais de um quinto das do exemplar impresso.
Foi só uma experiência, mas, como o resultado superou as expectativas, já cogitamos a hipótese de repeti-la no futuro", conta Eliete Cotrim, gerente comercial da 34.

Já a Objetiva criou o selo digital Foglio no final do ano passado, destinado a publicar obras com até 15 mil palavras. A primeira leva oferece textos de Luis Fernando Verissimo sobre jazz, contos de Ana Maria Machado e poemas de Mario Quintana, por preços que variam entre R$ 4 e R$ 8.

Em tese, o e-short é a vitrine ideal para autores estreantes de narrativa curta. Ao contrário do Kindle Singles, contudo, as grandes editoras brasileiras contentam-se em reposicionar um conteúdo já publicado pela casa. Pelo menos por enquanto, a aposta em novos autores é feita apenas por editoras menores ou voltadas para a literatura de nicho, como a Draco, de São Paulo, cujo hit digital é o conto "A torre das almas", de Eduardo Spohr.

"Como livros de R$ 2 a R$ 5 não doem no bolso, leitores que não conhecem autores ou selos podem experimentar sem medo de se arrepender da compra", justifica Erick Sama, editor da Draco.

Para Bernardo Ajzenberg, diretor executivo da Cosac Naify, a venda fracionada funciona mais como um incentivo à compra integral de uma determinada obra.

"Os contos avulsos, até agora, têm mais o sentido de uma amostra do conjunto da obra em que eles estão inseridos", explica Ajzenberg. "No caso da Cosac Naify, é preciso considerar que o livro impresso traz um conteúdo bem mais amplo, como prefácio, posfácios, dados biográficos e apêndices, que não se encontram no formato avulso. Entendemos que o maior potencial está nos ensaios, livros de referência, que prescindem, em tese, de muitas imagens ou ilustrações".

A forma tímida como as editoras brasileiras adotaram o e-short mostra que a fórmula ainda passa por um período de testes. "As editoras no Brasil estão numa fase de experimentação com os e-shorts", avalia Camila Cabete, gerente sênior de relações com editores da Kobo, empresa que fabrica leitores digitais e comercializa e-books em parceria com a Livraria Cultura. "A ideia é ver como o consumidor vai receber para depois investir. Mas já dá para dizer que a aceitação está sendo muito boa. O formato tem tudo para ser o must de 2014".

Presença no Brasil

Antes de fazer comparações com o exterior, porém, vale lembrar que os e-books representam menos de 2% do total de livros vendidos no Brasil, contra 23% nos Estados Unidos em 2012. Com o mercado digital incipiente, o e-short acaba juntando o pior dos dois mundos: vendas reduzidas a preços ainda mais reduzidos. Por isso a opção de alguns em lançar apenas autores já famosos. "O marketing continua sendo um problema: como chamar a atenção de algo que não é conhecido?", lembra Machado.

"Quando você oferece o e-short de um clássico, pelo menos pega aquele cliente que acabou de comprar o tablet e procura algo conhecido e barato para testar o produto. É o cliente que não quer correr o risco de começar a ler uma obra longa e terminar no meio", explica.

Apesar do tamanho reduzido, os e-shorts não são necessariamente mais fáceis ou baratos de produzir. Obras fracionadas multiplicam as vendas, mas também a mão de obra das editoras.

"Quando você fatia um livro já existente em dez novos pedaços, precisa prestar contas novas para cada um dos pedaços", continua Machado. "Mesmo que venda bastante, pode não valer a pena".

Autopublicação

A autopublicação ainda é o terreno em que o e-short mais avança no Brasil, mas nem sempre com estratégias criteriosas. Entre os e-books mais vendidos da Amazon aparece "Aprender meditação, relaxamento, em um dia!", um texto curto de apenas dez páginas em que o editor se desculpa logo de cara por usar "um tradutor digital on-line que nunca é tão bom como uma pessoa real". Para Noga Sklar, fundadora da KBR, editora pioneira no mercado digital, a ideia de single não foi bem compreendida por alguns editores brasileiros.

"Muitos desses e-books baratos são praticamente amostras, capítulos, contos fracionados, às vezes com menos de dez páginas, histórias incompletas, atalhos utilizados por algumas editoras para vender caro vendendo barato", lamenta. "O leitor se sente enganado ao pagar, digamos, R$ 1,99 por um "livro" e descobrir que comprou gato por lebre".

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